sábado, 11 de agosto de 2018

Dodge 37


Dodge 37
Meu pai morreu em 58, mais precisamente no dia 22 de dezembro. Eu, pessoalmente, achei uma sacanagem. Sendo o mais novo da turma, por que justo eu ia ficar sem pai? Como judeu, não havia natal em casa, Todos os meus amigos tinham natal, Papai Noel, presépio, árvore, mas eu nada. Aliás, para descontar, eu até hoje monto um pequeno presépio em casa, com o Menino Jesus, José, Maria, os Três Reis Magos, o boizinho, a ovelhinha, o carneirinho e um pequeno dinossauro.
Houve um ano, acho que eu tinha uns nove ou dez anos, em que eu finamente ganhei um presente de Papai Noel. Na manhã do dia 25, eu olhei por debaixo da cama e lá estava ela, um caixa retangular, que eu abri sofregamente. Era um jogo de pingue-pongue, com duas raquetes, duas bolinhas e uma rede. Só faltava a mesa.
Ao falecer, aos 54 anos, meu pai nos deixou uma casa e um automóvel, o tal Dodge 37, cinza, enorme, com um cheiro peculiar do qual eu nunca vou me esquecer: um misto de óleo, gasolina, graxa e sei lá mais o quê.
De manhã cedo, meu pai, de pijama, descia e escada que separava os dois jardinzinhos em frente de casa, ligava a motor e voltava para tomar banho, fazer a barba, tomar café etc. Acho que nunca lhe passou pela cabeça que alguém pudesse roubar-lhe o Dodge.
Bom, mas ele morreu e o carro ficou ali, estacionado na calçada. Meu irmão e minha irmã, bem mais velhos que eu, não se interessaram pelo trambolho e o carro começou a dar sinais de que em breve, se nada fosse feito, ele ia simplesmente apodrecer.
E então alguma coisa foi feita: eu e o resto da molecada começamos a empurrar o Dodge Miguel Isasa acima, até o larguinho do bar do Castro, para, em seguida, subir rapidamente e deslizar até o largo da Batata, com o motor desligado, uma vez que ele não pegava mais, nem mesmo no tranco;
Milagre foi não ter atropelado ninguém na aventura,


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