segunda-feira, 28 de março de 2016

FANTASTIC FABLES



Ambrose Bierce


Saiu mais um livro meu: a tradução de 'Fantastic Fables', de Ambrose Bierce, um autor injustamente desconhecido no Brasil, mas que é genial. O único probleminha - se é que se pode chamar assim - é que esse livro não se encontra em nenhuma livraria. Quem se interessar pode entrar em contato com a Editora Dubolsinho ou comigo mesmo.
Segue abaixo um exemplinho:
                                      O CÃO E O MÉDICO
Um cão, ao ver um médico presente no enterro de um rico paciente, indagou:
- Quando o senhor espera desenterrá-lo?
- E por que eu iria desenterrá-lo? - espantou-se o médico.
- Quando eu enterro um osso - disse o cão - é com a intenção de desenterrá-lo mais tarde e roê-lo.
- Ah, os ossos que eu enterro - explicou o médico com um sorriso - não servem mais para roer.'

terça-feira, 22 de março de 2016

Zero!


O que sente um professor ao dar um zero para um aluno? Ainda se faz isso hoje em dia? Tenho a vaga impressão de que esse professor possivelmente será chamado à Diretoria para se explicar e provavelmente terá de voltar atrás e atribuir alguma nota ‘razoável’ para o tal aluno, correndo inclusive o risco de ser demitido no fim do ano.

Antigamente, o zero era distribuído de maneira muito mais, digamos, liberal ou magnânima. Nós, alunos, podíamos levar um zero, não diria por qualquer motivo, mas pelo menos por uma dezena de motivos. Por exemplo, um professor de latim daria zero ao aluno que pronunciasse errado uma palavra. Coitado de quem dissesse em plena aula ‘popúlus’, com a tônica na sílaba do meio, e não ‘pópulus’, como proparoxítona. E olha que em latim não existe acento! Esse levíssimo deslize bastava para a nota da sabatina, que é como chamávamos a prova mensal, fosse dividida por dois. Dessa forma, um 5,0 virava 2,5; um 8,0 virava 4,0 e assim por diante.

Um professor de português daria sem hesitação zero para quem escrevesse ‘excessão’ com ss, em vez de ‘exceção’, com ç, ignorando tudo o mais de correto que o aluno pudesse ter escrito em sua redação.

Eu mesmo tirava pontos de quem esquecia o ‘s’ da 3ª pessoa do singular na afirmativa do Simple Present. Quem escrevesse coisas como “she know what she’s doing”, “Jack never take a bus to school” tinha sua nota diminuída. Certa vez, numa reunião de Pais e Mestres, uma mãe me perguntou se aquele bendito ‘s’ era tão importante assim. “Minha senhora,” respondi, “aquele ‘s’ é responsável por metade do meu salário. Eu passo metade da minha vida ensinando que he, she e it exigem  -s no verbo no presente. Os alunos têm de respeitar isso.”

Quanto a mim, como professor, meu zero – acho – doía mais em mim do que no aluno.

A primeira situação, digna de punição com um redondo zero era a cola. A cola é inevitável, eu sei. Já diziam as Trovas da Faculdade de Direito do Largo da São Francisco:
Escola sem cola não é escola 
escola sem cola não há 
se tiram a cola da escola 
ninguém consegue passar!

Mas a cola me ofendia. E digo por quê. No 4º ano da Faculdade, nós iríamos fazer um exame numa 2ª feira. Era domingo e eu e um amigo estávamos estudando com extrema má vontade. De repente, nós dois tivemos o mesmo pensamento: “Quer saber, esse professor é tão besta que não merece que a gente perca este domingo ensolarado estudando. Vamos usar o tempo de forma mais útil. Vamos fazer cola!” Até hoje meu velho Código Civil está recheado de resumos de assuntos que iriam cair no exame. Havia até um índice! A cola me tornava um ‘professor besta’. Eu não merecia isso – acho.


A segunda situação era a ignorância, o desconhecimento total da matéria ensinada, a confissão sem vergonha de quem não tinha aprendido nada. Isso não me irritava, mas me entristecia. Então eu dava por semana duas, três, às vezes quatro aulas para aquela classe, fazia o melhor que podia para ensinar alguma coisa e no dia da prova, o desleixado ou deixava as respostas em branco ou só escrevia asneiras. Era triste. Eu me sentia derrotado. Em outras palavras, de alguma forma, aquele zero era para mim também.

sábado, 19 de março de 2016

Professor, o senhor acredita em Deus?



Para ensinar a diferença entre believe Ø e believe in, é necessário dar alguns exemplos. Aí é que a porca torce o rabo. Peço vênia para usar esta metáfora rural, tão exótica e inexplicável para mim, nascido e criado que fui em Pinheiros, em rua de terra asfaltada quando eu tinha seis anos. Nada entendo de porcas nem de rabos. Minha praia é (ou era) inglês.
O rabo da porca


But I digress. Voltemos ao believe Ø e believe in. Believe (sem a preposição in) significa aceitar que o que a pessoa está dizendo é verdade. Ex.: You don’t believe me? You think I’m lying to you? My God, I don’t believe it.

believe in são outros five hundred. Believe in significa ter fé em algo ou alguém, depositar confiança em alguém, acreditar na existência de algo. Ex.: I don’t believe in ghosts. Do you?

Voltemos à porca: e se um aluno pergunta Do you believe in God?, o que você responde? Se acredita, você diz sim e segue a aula, sem espantos nem protestos.

Mas se você não acredita, a resposta negativa pode deixar alguns alunos frustrados, irritados ou, no mínimo, espantados. Já aconteceu comigo. Se o diálogo prosseguir com a pergunta seguinte: Why not?, sua resposta, seja ela qual for, não será satisfatória. Por quê? Porque não.

Desta maneira, a saída pela tangente (outra metáfora que eu uso sem ter ideia do que seja uma tangente), parece ser dizer que você é agnóstico. É uma resposta elegante, sofisticada e você não se compromete. Entendeu, seu ateu de uma figa?
A tangente tá com cara de ser a linha verde (D-B)


quarta-feira, 16 de março de 2016

Ensinando inglês no século XXI

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Já não é mais assim?
                                                       
 Na Alemanha, pouca gente fala português. O Bubsko, por exemplo, meu neto de quatro anos, não fala. Um ano atrás, falava. E nós nos entendíamos muito bem. Ele pôs naquela cabecinha linda que o problema é meu: se eu quiser me comunicar com ele, eu que aprenda a língua que ele usa no Kindergarten, no parquinho e, sobretudo, em casa.

A muito custo, consegui que ele repetisse – por pura gozação, que eu sei – a falar melancia, leite e menina. Não faço ideia porque ele escolheu essas três palavras, mas foram as únicas que eu consegui arrancar daquela boquinha de anjo.

Derrotado na minha vã tentativa de ensinar-lhe a última flor do Lácio, inculta e bela, passei a interagir com ele na base da entonação, ou seja, pelo jeitão com que ele me mostrava um bonequinho, eu perguntava idiotamente: “Esse é o Captain Cody?” “Nein,” ele respondia, e emendava, na língua de Goethe: “Bla bla bla,blaaaa!” Com esse último ‘bla’ era tônico, eu deduzia qualquer bobagem e seguia daí, dizendo mil coisas que, muito provavelmente, não tinham a menor relação com o tal bonequinho. Acho que ele desistiu de mim, concluindo que o vovô é um verrückt irrecuperável, isto é, doido de pedra.

Bom, comecei a pensar, se não é assim que se ensina português para um alemãozinho adorável, como é que se ensina inglês para um brasileiro? Já não é mais do meu jeito? Nada de lista de verbos irregulares? Diferenças entre Simple Past e Present Perfect? Bobagem. Prepositions? Vade retro, Satanás!

Fui dar uma espiada nesses cursos de inglês on-line. Fiquei com a leve impressão de que se trata mais de uma lista de conselhos de auto-ajuda. Talvez eu esteja enganado.

E os tais teaching aids? Que fim levou o bom e velho giz? Agora, tremo ao pensar em entrar numa sala de aula, encarar aquele bando de delinquentes em potencial e, em vez de pousar meus text books na mesa, começar a aula usando LCD projects, film projectors, TV, computers, VCD players, multimedia e sei lá o que mais.
As poucas palestras que dei usando o temível power point só foram possíveis graças à inestimável ajuda do meu amigo Eduardo, sem o qual eu teria sido obrigado a declinar do convite para palestrar.
Este é o futuro - parece