quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Bullying - hoje e no tempo de Shakespeare

Todo mundo sabe o que é bullying: um tipo de atitude muito comum em escolas, que inclui ameças, fofocas, apelidos, provocações, podendo chegar a espancamentos e outras formas de constrangimento físico. O constrangimento maior, no entanto, se dá quando o bully, isto é, o cafajeste que ofende, ameaça ou humilha alguém mais fraco do que ele se utiliza da internet para divulgar mensagens de texto, emails, vídeos ou perfis falsos.
Algumas décadas atrás, os alunos que se formavam no Porto Seguro davam uma festa de despedida no Gallery, uma boate muito famosa nos anos 80 em São Paulo. Todos os professores eram convidados, mas eu, por timidez, por não saber dançar e por não ter smoking (ou por tudo isso junto), nunca ia. Até que um dia eu resolvi ir. Mas no último dia de aula para os ‘formandos’, uma semana antes da festa, eu presenciei uma cena que me fez mudar de ideia. Uns grandalhões do 3º colegial agarraram um garoto do 1º ano e o jogaram por sobre uma mureta. Uma queda de, no máximo dois metros. O menino não se machucou, porque aterrissou sobre um gramado, mas, assustado, todo marcado de vermelho nos braços, foi se queixar na Diretoria. Mais tarde eu entrei para dar aula na classe do garoto. Ele ainda aparentava estar mais ou menos em estado de choque. Aí eu pensei: não vou ter estômago para abraçar e cumprimentar aqueles rapazes na festa. E não fui. Nem naquele ano, nem nunca.
Pois é. E o que Shakespeare tem a ver com isso? Bem, a obra do Bardo está recheada de bullies: Graciano, tirando sarro de Shylock em O Mercador de Veneza, Demetrius e Chiron, dois irmãos ‘pra lá de mau-caráter’, que estupram e espancam Lavínia no meio do mato em Titus Andronicus, as gananciosas irmãs Goneril e Regan, que não se cansam de humilhar seu velho pai, o Rei Lear, o Príncipe Hal, filho de Henrique IV, que faz de palhaço um pobre empregado de um pub, só porque ele é um nobre e o serviçal é um pé-rapado. e, last but not least, Petrúquio, em A Megera Domada, que se dispõe a ‘domesticar’ Catarina, atormentando-a com as mais estapafúrdias ordens.
De Macbeth eu já tratei: o bullying se dá em dois níveis, ou seja, num plano mais explícito as bruxas, que ardilosamente ludibriam Macbeth, e num plano menos óbvio, sua esposa, que o manipula a seu bel prazer.
Como já falei de Macbeth alguns blogs atrás, agora é a vez de A Tempestade, que também este há pouco em cartaz em São Paulo. Próspero, Duque de Milão, é injustamente banido para uma ilha remota, em companhia de sua filha Miranda. Ao longo de toda a peça, Próspero usa seus conhecimentos de mágica para atormentar seus servos, manipular seus inimigos e arquitetar o casamento de sua filha com o Príncipe de Nápoles.

Como se pode ver, o bullying já era praticado há mais de quatro séculos. E, curiosamente, até hoje, não há um termo equivalente  na nossa língua para essa palavra tão antiga. Então, vai de bullying, mesmo. 

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