quinta-feira, 13 de novembro de 2014

TEMPOS DE ESCOLA

DE COMO A CLASSE SE REVOLTOU E EU AJUDEI
Quando eu estava no 3º ano do Clássico, minha classe se revoltou contra o professor de História.  Na primeira sabatina que fiz dois anos antes,  – a gente chamava a prova de sabatina – eu tirei 4,0. Era a primeira vez que eu tirava uma nota vermelha. Daquele dia em diante, eu jurei que nunca mais aquele professor ia me dar uma nota baixa. Aí eu comecei a anotar tudo, absolutamente tudo, que o homem dizia em aula. Ele não adotava nenhum livro, e aula era totalmente expositiva: ele falava o tempo todo e a gente se limitava a ouvir. A ouvir e, no meu caso, anotar. Meus colegas diziam que se ele espirrasse, haveria um atchim nos meus cadernos. Além disso, comprei os dois volumes da História da Civilização Ocidental, de Edward Burns, e para as sabatinas, eu estudava comparando o que o cara dizia com o que o livro registrava.
Pois bem. No 3º colegial, a classe se rebelou.
Eu e alguns amigos passamos horas decidindo o que dizer ao diretor. Depois de muita discussão, chegamos a um resumo indestrutível:
1.    1. ele não sabia História. Tínhamos provas, todas registradas, com data, nos meus cadernos. Era só confrontar o que ele tinha dito em aula com os livros do Burns;
2.   2.  ele cometia erros crassos de Português, coisas como “houveram ocasiões em que...”, “ele disse para mim fazer...” Estava tudo nos meus cadernos.
3.    3. ele não tinha didática. Humilhava os alunos, de vez em quando. Exemplo: pediu para uma aluna escrever o nome do Papa Pio XII na lousa e ela errou. Escreveu Eugenio Paceli. com um L só. Fazendo ironia, ele foi até o quadro-negro e corrigiu, escrevendo Eugenio Pacceli, com dois Cs e um L Está errado também: o certo é Eugenio Pacelli.  
O diretor foi até a nossa sala durante uma aula de História. Vários alunos se manifestaram, na cara do professor, apresentando cada um seus argumentos. Se vocês pudessem ver a expressão do homem... Pálido, lívido, morto.
A coisa estava indo bem para o nosso lado. O diretor nos ouvia e acho até que assentia levemente com a cabeça. Mas aí o Avallone, esse mesmo Roberto Avallone que hoje é comentarista esportivo, falou mais ou menos seguinte:
- E tem mais: o nível das aulas dele é tão baixo que se pode comparar com os livros do Joaquim Silva.
Nisso, o diretor avançou até a carteira do Avallone (nós pensamos que ele ia dar um tapa na cara do rapaz), apontou o dedo trêmulo para ele e berrou, literalmente berrou:
- Deite-se quando falar o nome de Joaquim Silva!
O diretor se chamava Ariovaldo Silva e era o filho de Joaquim Silva, o autor de um dos mais populares livros de História do Brasil nos anos 40 e 50.

O sinal bateu, o diretor e o professor se retiraram, conversando baixinho. Nós ficamos com cara de besta, sem saber direito o que tinha acontecido. Mas uma coisa é certa: daquele dia até o fim do ano, ninguém mais tirou nota baixa nas sabatinas.

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