quarta-feira, 7 de setembro de 2016

"Não se aprende nada na escola"



Millôr: mais atual do que nunca
Millôr Fernandes, o imortal que não vestiu o fardão da Academia, chegou a escrever, ainda na década de 50, que era contra a escola. Pena que eu não consigo encontrar esse texto na internet, mas believe me, o homem escreveu isso mesmo. Para ele, não devia haver salas de aula, nem tampouco professores. Em vez de salas de aula, bibliotecas; em vez de professores, orientadores. Os alunos não teriam aula, aquela aula expositiva durante a qual eles tinham de se comportar sentadinhos, enquanto o professor fazia ou dizia o que sua autoridade lhe permitia.
Eles, uma vez que tivessem aprendido a ler, escrever e ‘fazer contas’, teriam a liberdade de pesquisar nos livros os assuntos que lhe interessassem. Notem que, nessa época, não existia o computador.
Summerhill

Na década de 1920, Alexander Sutherland Neill, um educador escocês, fundou Summerhill, uma escolinha no leste da Inglaterra, que existe até hoje. É a primeira escola verdadeiramente livre na história da educação, na qual os alunos e os professores decidem, em assembleias, e através do voto, o que eles querem estudar. Não só o quê, mas como e quando. É um internato. Eles vivem e estudam lá. Não há divisão de alunos por faixa etária. É tudo junto e misturado. Os professores não dão aula, a menos que a maioria decida em contrário. No mais das vezes, os mestres se limitam a orientar a curiosidade da meninada.
Indagado certa vez se Summerhill já havia produzido alguma figura de destaque no Reino Unido, A.S. Neill respondeu mais ou menos o seguinte: “Não, minha escola de maneira geral não forma médicos, engenheiros, advogados, muito menos políticos. Meus ex-alunos são hoje mecânicos, eletricistas, marceneiros...” E, depois de uma pausa, completou: “mas todos felizes.” Isso também aconteceu antes da internet.
Escola da Ponte
O Professor José Pacheco fundou em Portugal a Escola da Ponte, que em muito se assemelha a Summerhill. Numa entrevista publicada na Folha de São Paulo em 6/9/16, ele faz afirmações contundentes, das quais transcrevo algumas:
1.   “Não se aprende nada numa aula. Quando digo isso, há professores que se levantam indignados e dizem que aprenderam tudo na aula.”
2.   “A escola que está aí, igual à do século XIX, só produz ignorância e infelicidade.”
3.   ‘Será que um médico trabalha com os recursos e com as fundações teóricas do século XIX? Não. O professor trabalha.”
4.   “As novas tecnologias são incontornáveis. Nós as autorizamos ao limite: a criança trabalha com o celular, o iPhone, o laptop, tudo. Desde que haja acesso à informação, vamos lá.”
Tudo muito bom, tudo muito bem. Todavia, gostaria, data venia, de fazer algumas observações. O século XX, que acabou agorinha, produziu gênios do quilate de Bill Gates, Steve Jobs, Alan Touring (computador), Carlos Drummond de Andrade, Gabriel García Márquez, Wilkins, Crick e Watson, Salvador Dali, the Beatles, Oscar Niemeyer, Charles Chaplin, entre muitos outros. Todos eles estudaram em escolas caretas, quadradas, chatas.

Para encerrar: eu, que sou um produto do século passado, também estudei em escolas assim e fui um professor assim. Será muito deprimente chegar ao fim da vida, constatando que eu não ensinei nada, meus alunos não aprenderam nada e, portanto, não me devem nada. 

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